11 de agosto
Neiton de Paiva Neves
No tempo do Brasil Colônia, Portugal não permitiu a criação de cursos superiores no Brasil e os brasileiros tinham de sair do paÃs, se quisessem e se pudessem, para cursar uma universidade.
O conhecimento proporciona uma visão libertária, induz à reflexão, atiça o raciocÃnio, aguça a consciência crÃtica. Não interessava a Portugal ter uma Colônia com cursos superiores. Manter o povo na ignorância, ou dar-lhe apenas uma camada superficial de verniz escolar, tudo bem, ajudava a mantê-lo submisso.
Em seu livro “O Brasil na Hora Atual”, Manuel Bonfim faz referência ao documento do Governador do Maranhão naquele tempo, o português Antônio Fernando de Noronha, que se opunha à criação de cursos superiores no Brasil com esta categórica afirmação: “... estudos superiores só servem para nutrir o orgulho e destruir laços de subordinação legal e polÃtica que devem ligar os habitantes à Metrópole”.
Até a Independência, alguns poucos brasileiros abastados tinham conseguido estudar Direito, quase todos em Coimbra, Portugal. Essa pequena elite veio a ser responsável pela criação dos cursos jurÃdicos no Brasil, levando a questão a debate na Assembléia Constituinte de 1823, na qual foi apresentado projeto para implantar duas universidades, uma em São Paulo, outra em Olinda.
Diversas emendas surgiram, cada uma levando as universidades para e terra de seus autores. O ciúme, o bairrismo e o imediatismo provincianos, quase sepultaram o projeto, finalmente aprovado em 04 de novembro de 1823, e sancionado pela própria Assembléia Constituinte. Uma semana depois, em 12 de novembro, o Imperador Pedro I deu o golpe, dissolveu a Assembléia Constituinte e as universidades ficaram no papel.
Já sob a vigência da Constituição do Império (promulgada em 25 de março de 1824), depois de muitas e acirradas discussões, a Assembléia Geral (Poder Legislativo Federal, na ocasião) aprovou em 04 de julho de 1827, e, em 11 de agosto do mesmo ano, o imperador sancionou e converteu em lei, o Projeto criando os dois primeiros cursos jurÃdicos no paÃs, um em São Paulo e outro em Olinda, logo transferido para Recife.
As duas faculdades pioneiras tiveram papel preponderante na formação e no aprimoramento da intelectualidade brasileira. Nas palavras de Clóvis Beviláqua, “constituÃram poderosos focos de irradiação jurÃdica, filosófica e literária, alcançando os mais longÃnquos sertões da terra brasileira. Quase todas as doutrinas, teorias e idéias, que agitaram o mundo intelectual do paÃs ou partiram das Faculdades de Direito, ou nelas adquiriram ressonância maior”.
Exatamente por isso, a maioria dos grandes movimentos em favor da liberdade no Brasil, desde os primórdios, teve inspiração e se formou nos cursos de Direito. Foi assim com a libertação dos escravos, com a Revolução Constitucionalista de 1932, com a recente redemocratização do paÃs, com o movimento que resultou na renúncia do presidente Collor, dentre inúmeros episódios da história pátria.
É claro que o ensino jurÃdico e o papel do advogado passaram por transformações acentuadas ao longo dos anos. Nos primeiros tempos, o Bacharel em Direito tinha espaço assegurado na burocracia da administração pública ou na polÃtica. Estudar Direito era garantia de trabalho e de prestÃgio.
Hoje, o Curso de Direito voltou a ser disputado nos vestibulares; muitas escolas estão oferecendo ensino de qualidade; as carreiras jurÃdicas (magistratura, ministério público, segurança pública, magistério etc.) despertam grande interesse nos jovens advogados, e a atividade do advogado profissional liberal, embora ainda seduza alguns, cada vez mais cede espaço ao advogado assalariado/empregado, no setor público ou privado.
Tudo isso começou há 183 anos, em 11 de agosto de 1827, com a criação dos cursos jurÃdicos, exemplo vivo da influência das escolas na consolidação da independência dos povos. Povo sem conhecimento jamais será um povo livre. A universidade, onde se aninham as almas irrequietas da juventude em todos os tempos, é o maior fator de desenvolvimento de um indivÃduo e de uma nação. Nas universidades surgem idéias, afloram embriões que germinam, crescem e frutificam; delas se irradiam as forças propulsoras incontroláveis da vocação e da inteligência.
Não é por outra razão que, em 1968, o Conselheiro Edson Franco afirmou: “A demanda dos cursos de Direito pode ser considerada em função de que tal tipo de ensino tem se prestado ao desenvolvimento social, menos pela militância profissional e mais pela cultura que proporciona aos seus concluintes para o desenvolvimento comunitário”.
A Constituição Federal destaca que: “O advogado é indispensável à administração da justiça...” (art. 133), tanto quanto o juiz e o promotor, e a cada qual cumpre exercer a sua função com independência, harmonia e respeito mútuo.
Contudo, é bom lembrar que para ser advogado não basta ser Bacharel em Direito; é preciso ser aprovado no exame e se inscrever nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, mais do que um simples órgão de classe e tema para outra oportunidade.
Portanto, 11 de agosto é o Dia do Advogado, comemorado com orgulho, gratidão e humildade, lembrando a criação e a história dos cursos jurÃdicos, como tributo aos grandes nomes do passado e do presente, e com esperança de que os trabalhadores do Direito em todas as áreas estejam prontos e aptos para os novos tempos e os novos desafios, sem esquecer os antigos, em sua tarefa de garantir a administração efetiva de uma justiça verdadeira.
O Digesto, livro da codificação romana, já definia advogado como “aquele que expõe ante o juiz competente a sua intenção ou a demanda de um amigo, ou para bem combater a pretensão de outro” (em Liv. III, Tit. I e II).
ResponderExcluirO termo advogado pode ser conceituado modernamente como sendo “toda pessoa, licenciada em direito e munida do diploma profissional, regularmente inscrita na Ordem, cuja profissão consiste em consultar, conciliar e pleitear em juÃzo”. Aà reside as três grandes satisfações do advogado: “o prazer de conciliar, o prazer de pleitear e o prazer de ganhar o processo”.
Na Grécia antiga, os cidadãos compareciam, pessoalmente, diante dos magistrados, para expor e defender os seus direitos. As leis de Sólon concediam a faculdade de o cidadão ter um auxilio por parte de um amigo “amici” que coadjuvasse as suas explicações. Os juÃzes, chamados arcontes, interrogavam as testemunhas e colhia as provas e depois chamava as partes a exporem oralmente suas pretensões no caso. Daà surgiu os “Oratores” que auxiliavam os litigiosos com suas exposições orais perante o juiz. Esses podem ser considerados os primeiros ‘advogados’.
Era lei em Atenas que nenhum orador poderia cobrar honorários ou ter qualquer tipo de ganho na defesa de uma causa de outra pessoa. Na prática, essa lei não era cumprida a risca, mas um orador ateniense nunca poderia se apresentar como um profissional ou especialista em defesas. Eles argumentavam serem cidadãos comuns que cumpriam com seus deveres ajudando amigos apenas por generosidade e sem intenção de ganho material, sendo assim, eles não se organizaram em uma profissão formal – não possuindo associações, nem tÃtulos e outras regalias de uma profissão organizada.
Segundo Plutarco, o primeiro advogado da Grécia foi o grande orador Demóstenes (século IV), pelo fato de que se dedicou ao estudo das leis, demonstrando vocação extraordinária para a interpretação e a comparação de textos de leis da época. Demóstenes tornou-se um dos mais famosos oradores do mundo antigo depois de exercitar-se duramente nas artes da eloqüência: como era gago, para superar o defeito colocava pedrinhas na boca durante os exercÃcios, à beira-mar, em que fazia a voz sobressair sobre o barulho das ondas.
Tanto na Grécia quanto em Roma sempre se tentou proibir os advogados de receberem honorários, mas sempre essas proibições foram ignoradas. Em 204 a.c. uma lei romana foi promulgada para proibir o recebimento de honorários mas foi revogada pelo Imperador Claudius, criando a classe dos primeiros juristas a exercerem livremente a profissão, mesmo assim com um teto máximo para os honorários.
Ainda hoje o maior atrativo para a profissão são os honorários, mas os mais bem sucedidos são aqueles que sentem prazer em ajudar os amigos e que tratam com humildade a parte já estressada com o conflito que carrega. Parabéns, Doutor, creio que possui o perfil de exÃmio conciliador.
Pena que o advogado não faça seis meses de estágio dentro mesmo de uma prisão.
ResponderExcluirRealmente digno de nota, como, aliás, lhe é peculiar. Com a maestria de sempre fora abordado pelo professor um tema importante dando os devidos contornos históricos e contemporâneos. Parabéns por este artigo bem como pelo dia do Advogado, felicitações últimas que a estendo a todos os demais Advogados, no qual me incluo.
ResponderExcluirTemos no momento dois crimes expostos diariamente na mÃdia: um supostamente cometido pelo goleiro Bruno e outro em que foi assassinada a advogada Mércia e cujo suposto autor é um advogado. Os advogados de defesa estão em super exposição e não saem dos noticiários ou dos programas de TV.Sabemos que a tradição da advocacia é nunca recusar uma defesa criminal, sendo esta um direito e dever do advogado, sem que se considere sua própria opinião sobre a culpa do acusado. Texto belÃssimo de Rui Barbosa refere-se ao assunto - "não há causa em absoluto indigna de defesa".Mas tenho a impressão que, nos casos acima citados, os advogados têm extrapolado este direito e dever, tentando criar provas e manipulando ridiculamente os fatos, agindo simplesmente contra a liquidação da verdade.É a minha impressão...
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