Sim, o Homem foi à lua. Por José Roberto Peters
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A ciência não explica tudo e nem tem esta pretensão. Mas entre explicações científicas e não-científicas opte pelas primeiras. Desconfie muito de quem tem explicação a todos os fatos e fenômenos do universo. Charlatães de plantão vivem a fazer predições e a ganhar dinheiro fácil, sempre por sobre a credibilidade humana. E, muitas vezes, dão às suas peripécias tratamento de ciência.
Os caçadores de óvnis, por exemplo, dizem que estão fazendo ciência. Mas, na verdade, eu nunca consegui entender porque um suposto ser alienígena sairia de uma civilização mais avançada, pra lá de alfa do centauro, na sua nave toda tecnológica e se daria ao luxo de vir assustar um agricultor lá em Dionísio Cerqueira, em Santa Catarina, ou uma dona de casa em Aparecida de Goiás. Sei lá, deve ser falta do que fazer.
Entre a astronomia e a astrologia eu fico com a primeira. É mais séria e capaz de melhores previsões. A astrologia, basicamente, diz que recebemos influências — gravitacionais e magnéticas — da posição dos astros no momento de nosso nascimento. Pois bem, um fusca que passe na rua em frente à maternidade proporciona uma força gravitacional — matéria atrai matéria na razão direta de suas massas e inversa do quadrado da distância, como já dizia Newton — maior que qualquer planeta situado em qualquer parte do Universo. Sobre a influência magnética, então, o rádio ligado na recepção da maternidade, sintonizado na rádio Araguari, por exemplo, ganha das emissões vindas de Marte. Dependendo do programa pode ser até um problema pro recém-nascido.
A mim, uma das melhores cenas do filme Uma Mente Brilhante — com Russell Crowe e que conta a história de John Nash, matemático e prêmio Nobel de economia e criador da teoria dos jogos — é quando ele e a futura esposa estão numa sacada, durante uma festa, e ele pede que ela diga uma forma. Ela fala cadeira. Nash pega o braço da namorada e desenha, ligando estrelas, uma cadeira. Ela poderia ter pedido escorpião, sagitário ou qualquer outra sandice que lhe viesse à cabeça.
Você, leitor, pode não entender a ciência. Pode até “estar-nem-aí” para ela. O mundo vai continuar na sua trajetória, não se preocupe. Já dizia Fernando Pessoa, em A Tabacaria: “O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?). Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica”. Mas digo-lhe uma coisa: você será uma presa mais fácil para manipuladores. Quer ver? Você sabia que o CO2 — o vilão do momento — é responsável por apenas 2% do efeito-estufa? E que o homem contribui com apenas 3% das emissões deste gás na natureza? A maior parte das emissões vem de causas naturais. E 98% do efeito-estufa é causado pelo vapor de água. Uma coisa difícil de deter num planeta que tem dois terços da sua superfície líquida.
E não se espante com os avanços tecnológicos. Eles estão aí desde antanho. A televisão, por exemplo, transmite o seu primeiro jogo de futebol em 1936, na Alemanha de Hitler. Era um jogo contra o pessoal do Mussolini. Imagina o perfil da torcida. Os dois lados devem ter passado o jogo cantando: “aqui tem um bando de loucos”. A copa de 58 — na qual os brasileiros (des)encantaram — foi transmitida ao vivo para toda a Europa. Em 70, por satélite, para todo o mundo. Assim, o satélite é anterior à copa do México.
Vamos viajar ainda mais no tempo. Em 1824 a distância Terra-Sol é medida com precisão. Nascem, em 1826, as geometrias não-euclidianas. A lua é fotografada em 1839. Em 1860 são feitos os primeiros estudos sobre a teoria dos corpos negros, marco inicial da moderna física quântica. A descrição da teoria do efeito-estufa é feita em 1863. Em 1905 Einsten propõe a teoria da relatividade. E por aí vai.
Estas datas e acontecimentos — muitas vezes inúteis à maioria dos mortais — foram escolhidas para um propósito: tentar refutar uma das teorias da conspiração que de tempos em tempos volta à tona: a de que o homem não foi à lua. Foi sim. Esteve lá sim. Caminhou e até trouxe alguns souvenirs. A transmissão foi ao vivo, desde a lua, via satélite, até a sua casa, se é que naquele dia — 20 de julho de 1969, às 16:18 horas no horário de verão (nos Estados Unidos, é claro) — você tinha uma TV preto e branco ligada.
Os argumentos dos detratores desta façanha — chamados por alguns cientistas de paranóicos ou comunistas convictos — são muitos. E, como em toda teoria da conspiração, não são fracos e, utilizando um linguajar científico, conseguem cooptar leigos e desconfiados de plantão, que saem por aí vomitando teorias. Geralmente são pessoas com pouca ou quase nenhuma formação acadêmica em ciências, que preferem, por exemplo, ler sobre física quântica na revista Planeta ou em Paulo Coelho ao invés de ir abeberar-se em Einstein, Born, Heisenberg ou Schrödinger, para citar alguns.
Muitos dos defensores desta teoria vêem somente um lado da questão. Não procuram um contraponto ou uma explicação vinda de fontes mais seguras. Tratam a “coisa” como verdade. Tratam a si mesmos de “cientistas”. Ora, a ciência não promete a verdade. Até porque verdade não é um conceito de ciência. Está mais para religião. A ciência não é neutra, ela atende a interesses — muitas vezes espúrios e eminentemente econômicos. Muitas das inovações tecnológicas estão ligadas à guerra. Pesquisas de remédios, por exemplo, são pagas e muitas vezes não acessíveis àqueles que não podem pagar.
Mas vamos à lua. Conceitos básicos de física são suficientes para abalar os crentes na teoria conspiratória de que o homem nunca pisou na lua. Um dos primeiros argumentos era de que o homem, em 1969, não tinha tecnologia para isso. Mentira. A tecnologia estava disponível. Não a todos, é claro. E não sejamos ingênuos a ponto de pensar que os bilhões gastos para mandar o homem à lua — ou para criar uma farsa deste tamanho, como querem os conspiradores — pudessem ser usados para matar a fome na África.
Outro argumento dos conspiradores é de que não há estrelas no céu e estas deveriam ser visíveis. Leitores, para fotografar objetos que emitem pouca luz — como o caso das estrelas — é necessário que o tempo de exposição seja aumentado ou utilizar um filme que se sensibilize mais rapidamente, para diminuir este tempo. E mais, no caso da lua, para que as estrelas aparecessem na foto elas iriam concorrer com as roupas brancas dos astronautas e com o brilho da lua — que, você deve saber, não tem luz própria, apenas reflete o brilho do sol. Então, para apreciar as estrelas, teríamos uma imagem borrada, por causa dos seus concorrentes em emissão de luz. O tempo de exposição das fotos tiradas na lua é da ordem de 0,004 segundos. Em 1967, dois anos antes, uma sonda americana tirou fotos da superfície lunar onde aparecem as estrelas. Para estas o tempo de exposição foi de três minutos. Faça as contas: tempo 45 mil vezes maior que o da exposição das fotos dos astronautas.
Para o problema das sombras nas fotos é simples dizer que nós vemos os objetos porque eles refletem a luz em direção aos nossos olhos. Na Idade Média, por exemplo, achava-se que era o contrário. Por isso, quando uma pessoa via coisas que não deveria podia ter os olhos furados. Quando você está num quarto escuro de paredes escuras iluminado por uma única fonte de luz, nada que esteja sob a sua sombra será visível, pois a região não recebe luz e não pode ser refletida. Na Terra esta situação não é tão comum: recebemos luz direta do sol e também pela luz refletida na atmosfera, nas nuvens, no solo ou em qualquer outro objeto próximo capaz de reflexão. Neste caso, não são sombras, são penumbras, que não são totalmente isentas de luz. Na lua não há atmosfera para espalhar a luz. Desta forma, seria de se esperar que as sombras fossem completamente negras. Porém, o solo lunar é composto por silicatos brilhantes que atuam como reflexores e, também, o módulo lunar e as roupas dos astronautas ajudam neste aspecto.
E mais, o terreno lunar não é plano, o que explicaria as diferenças de tamanho das sombras. Duas pessoas em níveis diferentes de altura teriam sombras de tamanho diferentes, mesmo se fossem do mesmo tamanho. A pessoa no nível maior lança uma sombra maior que outra que esteja abaixo. Quer outra? Duas sombras somente serão paralelas se estiverem em duas superfícies paralelas, coisa difícil de conseguir em um terreno não plano.
Para explicar a ausência de marcas profundas do módulo lunar no solo vale lembrar que este possuía cabos sensores em três das suas quatro plataformas de pouso. Quando um destes cabos tocou no solo lunar o piloto desligou os jatos e o módulo pousou “suavemente”. Isto fez com que as marcas no solo lunar fossem menores do que queiram os conspiradores.
A tal letra C, que aparece em uma foto já foi investigada mais amiúde e cientistas, examinando os negativos, descobriram tratar de um fio de fibra que se havia depositado sobre o filme antes da revelação. O grande problema é a confusão que fazem os conspiradores: a foto em questão foi feita na Missão Apolo 16, e quem esteve na lua pela primeira vez foi a Apolo 11.
O problema da bandeira tremulando é simples. Só vemos a bandeira tremulando quando o astronauta finca-a no solo, rodando sua haste para que esta penetrasse no solo, mais duro que se supunha. Após isto a bandeira ainda tinha um movimento residual. Nas cenas seguintes a bandeira está imóvel. Ela também está esticada, o que seria impossível devido à ausência de vento. Para isto a bandeira contém também uma haste horizontal que faz com que pareça balançar ao vento.
Isto tudo posto vem a pergunta: se o homem foi à lua porque não voltou mais? Bem, primeiro é que os americanos correram para a lua antes que os soviéticos o fizessem. E gastaram um bom dinheiro nisso. Hoje em dia é mais barato mandar sondas e robôs. Assim, foi mais uma missão militar em épocas de Guerra Fria que qualquer outro tipo de empreendimento, mesmo que científico. O maior objetivo era mostrar superioridade. Neste aspecto mostraram. Depois disso, os Estados Unidos foram resolver suas pendengas no Vietnã, onde também derramaram um monte de dinheiro. Além do mais os espectadores americanos perderam o interesse de ver astronautas voltando com nada além de pedras. As audiências caíram. E quando a audiência cai vocês sabem o que acontece.
São muitas as teorias conspiratórias. E muitos os que embarcam nelas. Muitas vezes nem é bom ficar dando corda. Você sabe leitor, quanto mais se mexe mais fede. Mas o fato é que muitas destas leituras são divertidas. É claro, também, que há gente séria que as defendem. É óbvio que em muitas delas há indícios de que não devemos acreditar em tudo que é oficial. Até porque sabemos que todos os discursos — oficiais ou não — estão recheados de ideologia e que se não tivermos uma posição crítica ficaremos à mercê de espertalhões, que nem sempre nos têm em alta conta e só esperam uma oportunidade para nos fisgar.
* José Roberto Peters – Mestre em Educação Científica e Tecnológica, professor universitário e consultor técnico da OPAS no Ministério da Saúde
** Artigo publicado originalmente em 2/4/2015.
Não, o homem não foi a lua! =P
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