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O silêncio dos bons


Neiton de Paiva Neves
(*)
(Artigo publicado originalmente na revista Evidência)

Velha polêmica é aquela que questiona se deve ou não ser reconhecida a inteligência de pessoas que a usam para  fazer o mal, cujo conceito é também polêmico, assim como o do bem, geralmente por conveniência.

Abstraindo conceitos e especulações filosóficas, não me parece correto o argumento de que quem é inteligente não faz o mal e faz só o bem. Se assim fosse, se só os tontos e parvos fizessem o mal, seria muito fácil enfrenta-los e vencer o combate.

Aqueles que se enveredam pelos caminhos que as pessoas de senso comum entendem ser o do mal, do errado, do condenável, parecem compor, basicamente, dois grupos, os dos pequenos e dos grandes criminosos.


Os pequenos são pequenos em tudo. Na competência para delinquir, nos delitos que praticam, na repercussão deles quando descobertos e no curto fôlego para escaparem da punição.

Os grandes são grandes em tudo. Agem com extrema competência, praticam crimes incríveis, que, quando e se descobertos, alcançam repercussão enorme, respirando e contando sempre a impunidade.

Neste  nosso Brasil (nem só aqui, concordo) a impunidade tem premiado os corruptos  e assaltantes, principalmente, dos cofres públicos. O roubo escancarado do dinheiro público é tamanho e tão antigo que não há como deixar de se perguntar como é que este país ainda sobrevive.

A grande rapinagem do momento, quer dizer, que agora veio foi revelado, é liderada pelo contraventor Carlinhos Cachoeira, amigo do peito do senador goiano Demóstenes Torres (até pouco tempo vestal da honestidade), de governadores, parlamentares, empreiteiros, etc. (esse etc. é o que mais preocupa).

O esquema da roubalheira/Cachoeira parece ser o maior e mais abrangente que se conhece nos últimos anos, diante do qual o do mensalão, enorme, parece coisa de trombadinha.

Sendo antigo como é, não se sabe a razão pela qual ficou tanto tempo escondido,e não está muito claro porque só agora veio à tona, embora tudo indique que  foi em decorrência de interesses contrariados, políticos, eleitorais, financeiros, e outros.

Gravações feitas durante anos revelam envolvimento de um número impressionante de pessoas altamente comprometidas com a safadeza e a corrupção.

A Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada no Congresso Nacional e as primeiras medidas que tomou já anunciam que veio mais para por panos quentes do que para apurar o tamanho do rombo e quais são os responsáveis por ele.

É claro, alguns peixes menores (força de expressão, porque neste mar de lama não há peixes pequenos) vão pagar o pato. Mas, alguém acredita que os maiorais, os mais inteligentes e competentes, que planejaram, montaram e mais usufruíram do grande roubo, vão ser punidos?

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Em tempo: Aqui, gosto sempre de falar sobre coisas amenas. Mas, a indignação cidadã me levou ao texto acima. É que me ficaram martelando estas terríveis palavras de Martin Luther King: “O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética... O que me preocupa é o silêncio dos bons."

(*) Neiton de Paiva Neves é advogado. Foi prefeito de Araguari, de 1983 a 1988, e diretor da Faculdade de Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos - Campus Araguari.

3 comentários:

  1. Neiton, é muito gostoso falar de amenidades e você faz isto muito bem. Mas é importante que as pessoas que tenham acesso aos meios de comunicação e que possam expressar-se através deles, mostrem a sua indignação e façam a sua parte como cidadãos, nestes tempos em que a corrução e tantas outras mazelas grassam pelo país afora.Você tocou num ponto importante e preocupante, a impunidade. Até quando vamos assistir os grandes corruptos voando nas asas da impunidade enquanto outros, menores,submissos, pagam o pato?

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  2. Mestres, mestres, digam-me a origem do mal para podermos combatê-lo ou extirpá-lo pela raiz! Que sistema é esse que se tornou capaz de inebriar os conterrâneos de boa fé, os homens de bem e ainda escamotear as leis e fazer fortunas desprezando tantas carências e tanta pobreza? Bem sabemos que em poucas nações se viu virtudes nos sistemas de governo coletivo. Mas, do que são formados esses sistemas? Ou que mentes sustentam esses sistemas senão aquelas crianças que cresceram vendo os exemplos e que depois os perpetuam? É a mesma antiga e eterna mente humana que oscila entre pensamentos bons e maus. Não há leis nem sistemas perfeitos capazes de evitar a capacidade de gerar mazelas de um caráter deformado, pior quando essa deficiência moral se torna crônica e contamina uma geração. Temos no sistema efeitos das deficiências de caráter. Acho que Aristóteles já conhecia suas causas. Talvez tenha sido ele que ensinou a concentrar nas virtudes para se distanciar do mal, encontrando no equilíbrio, ou no caminho do meio, segundo os chineses, o antídoto para manter as mentes ociosas ocupadas com os prazeres que as virtudes e as artes imprimem na alma!

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  3. Concordo plenamente com o dr. Neiton. Dificilmente, o sistema entrega algum boi às piranhas. Quando o faz, cede um boi velho e doente. Enquanto isso, a boiada (a corrupção) avança. Aproveito para fazer uma indagação. Normalmente, em Araguari todos falam da corrupção nacional. Dificilmente, alguém toca na ferida que a corrupção doméstica. Por que será? Penso que aí entra a tese de que, em Araguari, todo mundo é amigo, parente ou amante de algum poderoso. Logo, é comum fazer vistas grossas para os deslizes dos nossos "Cachoeiras".

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