Juventude interrompida
MarÃlia Alves Cunha
O adolescente tem 13 anos. Deveria estar brincando, indo à escola, procurando no espelho, repetidas vezes, traços de masculinidade nascente, vaidade aflorando. Deveria estar praticando esportes, alimentando-se bem, olhar prá frente e pisadas seguras. Amigos, celular, meninas, primárias tentativas de passar de um salto da infância para a juventude. Deveria. O adolescente de 13 anos está acorrentado, preso em seu quarto. A própria mãe, num gesto desesperado de quem não tem mais saÃda, comete o ato vil. Aprisiona, encarcera, submete o menino à s correntes. É preciso livrá-lo das drogas e não há resquÃcio de luz no fim do túnel.
A casa é simples, assentada numa vila e a famÃlia dispõe apenas dos recursos necessários à subsistência. O quarto é despojado. Pobre. E o menino ali, acorrentado, esquálido, olhar perdido, rosto inexpressivo. A avó assiste chorosa, vontade de abraçar o neto, desimpedir suas pernas, a boca vez a murmurar orações, vez a imprecar. Os irmãozinhos aturdidos, participando da cena, entendimento curto, olhos espantados: o que será que o Dico fez agora?
Sabe muito bem a D. Maria, a mãe, quão errada e absurda é a situação. Tem consciência sim, do horror que está cometendo. A sua cabeça procura saÃdas, o seu coração arrebenta de dor. Corre o risco de ser processada, de ser até presa, de perder a guarda dos filhos. Ainda prefere. O risco maior é ver o filho morto ou perambulando trôpego pelas ruas, ver o filho violento, atentando contra as pessoas, ver o filho roubando, sofrendo agressões, sendo ameaçado. O Dico não é bandido, tem apenas treze anos, mal começou a caminhada. De repente foi arrastado como milhares o são, para o vÃcio, a doença, o limbo.
Já foi levado a consultas, tomou alguns calmantes, até um frasco de soro lhe foi servido para despistar a fraqueza. Esteve à s portas da morte, depois de ingerir explosiva dose de medicamento e droga, houve pedidos à Justiça no sentido de uma internação. As dificuldades são muitas, há procedimentos padrões a serem seguidos e os aparelhos sociais não atendem de pronto ás necessidades dos casos. As clÃnicas são poucas, quase sempre instituições religiosas ou sociais, de caráter privado. Muitas vezes piores do que os cárceres domésticos. Enquanto a solução tarda, a corrente funciona, assim pensa quem sucumbiu ao desespero.
O Dico é vÃtima de uma sociedade individualista, cada um para si, centrado no próprio umbigo. VÃtima de um Estado fraco naquilo que precisa ser forte, um Estado que nunca agiu com a energia e intolerância necessárias para combater o narcotráfico. VÃtima de um paÃs que não adota polÃticas públicas eficientes, voltadas à recuperação dos dependentes.
Somente as mães que sofreram na carne a dor de ver um filho se perdendo, que tentaram todos os remédios, que sentiram o desespero da impotência, que procuraram todos os refúgios possÃveis, que não encontraram a luz no fim do túnel, poderão entender atitude tão vil, grosseira, protetora e amorosa... Desanima não, D. Maria, continua buscando melhor solução. Tenha fé! Deus é grande e uma hora, quem sabe, as nossas crianças e jovens merecerão o devido respeito.
O adolescente tem 13 anos. Deveria estar brincando, indo à escola, procurando no espelho, repetidas vezes, traços de masculinidade nascente, vaidade aflorando. Deveria estar praticando esportes, alimentando-se bem, olhar prá frente e pisadas seguras. Amigos, celular, meninas, primárias tentativas de passar de um salto da infância para a juventude. Deveria. O adolescente de 13 anos está acorrentado, preso em seu quarto. A própria mãe, num gesto desesperado de quem não tem mais saÃda, comete o ato vil. Aprisiona, encarcera, submete o menino à s correntes. É preciso livrá-lo das drogas e não há resquÃcio de luz no fim do túnel.
A casa é simples, assentada numa vila e a famÃlia dispõe apenas dos recursos necessários à subsistência. O quarto é despojado. Pobre. E o menino ali, acorrentado, esquálido, olhar perdido, rosto inexpressivo. A avó assiste chorosa, vontade de abraçar o neto, desimpedir suas pernas, a boca vez a murmurar orações, vez a imprecar. Os irmãozinhos aturdidos, participando da cena, entendimento curto, olhos espantados: o que será que o Dico fez agora?
Sabe muito bem a D. Maria, a mãe, quão errada e absurda é a situação. Tem consciência sim, do horror que está cometendo. A sua cabeça procura saÃdas, o seu coração arrebenta de dor. Corre o risco de ser processada, de ser até presa, de perder a guarda dos filhos. Ainda prefere. O risco maior é ver o filho morto ou perambulando trôpego pelas ruas, ver o filho violento, atentando contra as pessoas, ver o filho roubando, sofrendo agressões, sendo ameaçado. O Dico não é bandido, tem apenas treze anos, mal começou a caminhada. De repente foi arrastado como milhares o são, para o vÃcio, a doença, o limbo.
Já foi levado a consultas, tomou alguns calmantes, até um frasco de soro lhe foi servido para despistar a fraqueza. Esteve à s portas da morte, depois de ingerir explosiva dose de medicamento e droga, houve pedidos à Justiça no sentido de uma internação. As dificuldades são muitas, há procedimentos padrões a serem seguidos e os aparelhos sociais não atendem de pronto ás necessidades dos casos. As clÃnicas são poucas, quase sempre instituições religiosas ou sociais, de caráter privado. Muitas vezes piores do que os cárceres domésticos. Enquanto a solução tarda, a corrente funciona, assim pensa quem sucumbiu ao desespero.
O Dico é vÃtima de uma sociedade individualista, cada um para si, centrado no próprio umbigo. VÃtima de um Estado fraco naquilo que precisa ser forte, um Estado que nunca agiu com a energia e intolerância necessárias para combater o narcotráfico. VÃtima de um paÃs que não adota polÃticas públicas eficientes, voltadas à recuperação dos dependentes.
Somente as mães que sofreram na carne a dor de ver um filho se perdendo, que tentaram todos os remédios, que sentiram o desespero da impotência, que procuraram todos os refúgios possÃveis, que não encontraram a luz no fim do túnel, poderão entender atitude tão vil, grosseira, protetora e amorosa... Desanima não, D. Maria, continua buscando melhor solução. Tenha fé! Deus é grande e uma hora, quem sabe, as nossas crianças e jovens merecerão o devido respeito.
Infelizmente, sem isentar a sociedade, dona Maria é carcereira de muitas de suas próprias falhas. Muitos filhos e pouco dinheiro, embora não sejam determinantes, possibilitam o desvirtuamento, principalmente infantil. A juventude tem sede de aventuras e de caminhos proibidos. Digo de cátedra, pois a liberdade a mim proporcionada deixou-me refém de cigarros, bebidas, prostituição e até mesmo maconha fizeram parte da minha rebeldia. Se na minha infância existisse o crack o mais certo é que não estaria gozando de minha aposentadoria. Livrei-me de tudo, graças a Deus! Minha mãe? Uma sortuda.
ResponderExcluirGrande MarÃlia! Você aqui se transforma em porta-voz e protetora de várias mães! Você possui passado que a autoriza. Parabéns a você pelo seu dia das mães inclusive a todas que agora você abrigou ao som do drama bem narrado. Parece que as autoridades estão surdas ou não assistem televisão ou também estão acorrentadas à s suas prioridades de compromissos de toda ordem. Ou não sabem desses casos. Resta a essas mães a esperança em Deus. E o choro sofrido e reprimido dessas mães, que acorrentam um filho em casa e se acorrentam a ele também, já não ecoam com a grandeza do seu grito na forma de sua crônica. Seu alerta deve ser ouvido e as providências devem vir sejam na forma de repressão aos traficantes, no fortalecimento dos conselhos tutelares paÃs a fora, que sofrem de impotência diante de tantos casos, sejam na forma de novos métodos de tratar essas crianças ameaçadas. Tudo isso é um pesadelo familiar e tudo isso pode ser superado com solidariedade. Que as donas Marias paÃs afora sejam ouvidas rapidamente e os Dicos não percam a certeza de que ainda poderão dar muitas alegrias a suas mães (a exemplo do Aristeu) e possam também compartilhar a aposentadoria deles com suas protetoras.
ResponderExcluirCada pessoa, de acordo com suas vivências, tem uma opinião a respeito de fatos como os que eu narrei. Não foram frutos da minha imaginação.Existem muitas Marias e muitos Dicos por este paÃs afora, em situação de total desesperança e falta de assistência, envolvidos pelo grave problema das drogas. Hoje é dia das mães. Mães sábias, analfabetas, ricas,pobres, generosas, rudes, inteligentes, carinhosas, mães... Cheias de falhas e defeitos, como todo ser humano. Capazes de amar, desesperar, acorrentar. O problema das drogas afeta todas as camadas sociais, famÃlias grandes ou pequenas, com dinheiro ou sem dinheiro. Narrei o caso do menino pobre, porque a pobreza alimenta o drama... Sábios e lindos os comentários, espero que muitos os leiam. Agradeço ao Natal pela homenagem prestada. Repito: apenas quem sofreu na carne a dor da impotência,o sofrimento de quem toda a luta parece perdida, pode imaginar...E parabéns, Aristeu.Você é um vencedor em batalha árdua, pode ter certeza.
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