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O dilema dos clubes diante da Medida Provisória do Futebol



Carlos Aragaki (*)

Em decorrência das dificuldades financeiras dos clubes que atualmente devem, aproximadamente, R$ 4 bilhões para a União, a presidenta Dilma Rousseff aprovou a Medida Provisória MP 671 que trata da renegociação das dívidas dos clubes de futebol (Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal dos Clubes de Futebol Brasileiro - Profut).

O texto da MP prevê a quitação das dívidas em 240 parcelas, além de estimular a profissionalização e modernização ao exigir contrapartidas dos seus representantes. As agremiações de futebol que aderirem a esse financiamento de dívidas terão que se submeter às regras de governança, transparência e responsabilidade fiscal. Todavia, o estímulo à criação do clube-empresa foi suprimido da MP.

Com relação à tributação atual dos clubes e a transformação em clube-empresa, no modelo atual, cabe a seguinte observação:

Em linhas gerais, caso os clubes decidam por se transformar em empresas, a tributação seria equivalente ao tributado nas empresas: 34% (15% + 10% adicional para o Imposto de Renda + 9% de contribuição social), para os que se enquadrassem no lucro Real / Presumido. Dessa forma, do ponto de vista financeiro, seria mais prático e menos oneroso para os clubes a sua manutenção como entidades sem fins lucrativos.

Falência é outro aspecto relevante a ser considerado, pois a Lei n.º 11.101/05 (Lei de Falências) regulamenta que as sociedades empresárias são passíveis de falência solicitada pelos credores. Atualmente, as entidades sem fins lucrativos não podem falir por não se caracterizarem como sociedades empresárias e por não visarem o lucro nos termos da lei. Sob essa ótica, não nos parece que seja vantajoso para os clubes a constituição de um clube-empresa nesses termos.

Uma empresa com fins lucrativos pode ser vendida, fundida ou cindida pelos sócios. Em 2005, quando comprado por um americano, o clube inglês Manchester United conheceu grande revolta por parte de sua torcida. Todavia, este não pode ser tomado como um único caso de sucesso. No Brasil, a paixão das torcidas se torna, por algumas vezes, irracional e não temos precedentes em grandes clubes sobre as reações a que estariam sujeitas as sociedades empresárias em caso de aquisição de um grande clube brasileiro por um investidor estrangeiro, por exemplo.

Para uma gestão profissional, não é necessário que os clubes se transformem em empresas. A profissionalização deveria ser instituída para uma melhor gestão, ainda que em entidades sem fins lucrativos desde que os clubes adotassem uma governança que hoje é rara nos clubes brasileiros. Para tanto, seria necessária a contratação de profissionais de mercado remunerados em áreas importantes de back office do negócio futebol (financeira, marketing e jurídica) que apoiariam o departamento de futebol (front office). Esses profissionais garantiriam que as operações necessárias para a administração dos clubes fossem realizadas por meio de busca da eficiência operacional, redução dos custos e minimização da exposição aos riscos clássicos do futebol – financeiros, jurídicos e de mercado – e poderiam sanar os problemas atuais que levam os clubes às dificuldades financeiras e à necessidade de recorrer a planos de parcelamento de dívidas.

Alguns clubes brasileiros já estão trabalhando com gestão profissional e suas demonstrações financeiras começam a refletir a redução de passivos fiscais e trabalhistas, bem como o crescimento das receitas. Todavia, no geral, a interferência não profissional é grande e muitas vezes não está alinhada com os objetivos de boa governança para os clubes, cujo interesse deveria ser único. Assim, adicionalmente, medidas mais radicais como alterações nos estatutos que aprimorem a governança e imponham obrigações mais severas aos dirigentes eleitos contribuiriam nesse processo.

As companhias abertas ou não e as limitadas possuem acionistas ou quotistas, o que não ocorre com os clubes brasileiros. Dessa forma, não há cobrança pela busca de gestão profissional dos dirigentes eleitos, que deveriam acompanhar e monitorar as áreas de back office. Assim, sem cobrança de acionistas e sem gestão profissional, os resultados para os clubes já são conhecidos por meio da busca de refinanciamento de dívidas fiscais e trabalhistas.

Sob a ótica das Cias Abertas, como pensar em investidores que se interessarão por comprar ações de clubes que não possuem governança corporativa? Tivemos dois exemplos de clubes que abriram o capital no passado, como o Bahia e o Vitória, hoje na série B do Campeonato Brasileiro, cujo fracasso foi verificado pelo mercado de capitais. Adicionalmente, dados recentes mostram que 167 empresas brasileiras fecharam o capital. Se os investidores não estão apostando nas empresas, por que o fariam pelos clubes?

Os dirigentes que estão na gestão dos clubes deveriam aprovar e coordenar a execução das estratégias do futebol, gerenciar riscos e criar padrões éticos de fato aplicados nas decisões do clube.

A aplicação de alguns pilares da governança corporativa também contribuiria muito para uma boa gestão sem a necessidade da transformação dos clubes em empresa. Pois, sabe-se que transparência e accountability já existem no futebol desde as leis 10.672/2003 e Timemania/2007, com a obrigatoriedade de elaboração de demonstrações financeiras, divulgação e/ou publicação dessas demonstrações auditadas por auditores independentes.

Dessa forma, entendemos que financeiramente o modelo atual de entidades sem fins lucrativos é o mais adequado se somado a gestão profissional dos clubes como se companhia aberta fossem. O fator que corrobora esse entendimento foi a exclusão do sonhado clube-empresa com a alíquota reduzida a 5% com o veto presidencial.

A grande questão sem resposta até agora: Os clubes estão preparados para mudarem culturalmente a sua forma de gestão e governança atuais?

(*) Carlos Aragaki, mestre em Contabilidade e Controladoria, é especialista em auditoria de clubes de futebol.

Um comentário:

  1. Os clubes brasileiros tem que pensar nessa juventude que não está muito ligada ao futebol tradicional. A tecnologia já toma conta da atenção desse novo público e isso reflete nos estádios. É necessário se pensar estratégias para atrair essa juventude, porque senão com o passar dos anos o futebol não terá retorno financeiro necessário para se manter.

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