Coisas que a gente imagina
José Roberto Peters (*)
Sempre que a gente ouve ou lê uma história imagina suas cenas. Nosso cérebro cria imagens a partir das referências que tem. Quem lê ou é bom ouvinte sabe disso. Na leitura a descrição de um personagem ou de uma paisagem vai ganhando contornos quase que reais em nossa mente.
Eu, por exemplo, sempre que ouço Feijoada Completa, imagino o Chico Buarque dando a notÃcia pra Marieta Severo: “mulher, você vai gostar, tô levando uns amigos pra conversar...” imagino a Marieta com as mãos na cintura — feito um açucareiro — falando: “mas, Chico...”.
Guimarães Rosa no Grande Sertão escreve “passarinho que se debruça – o vôo já está pronto” e me vem à imagem o pequeno pássaro em cima do galho num movimento que parece que está a fazer flexões e, de repente, se lança no ar. Assim como a gente quando se prepara e se prepara e se arrisca a fazer algo que nunca havia feito.
Já percorri as ruas de Macondo com Garcia Marquez. Andei por um mosteiro da Idade Média com Eco e por toda Londres com Sherlock Holmes e seu amigo Watson. Isso sem nunca ter saÃdo daqui. Acompanhei a prova do teorema de Fermat com Simon Sing. Maravilhei-me com Einstein e o efeito fotoelétrico. Tudo isso nas páginas escritas.
Quem não lê ou não é um bom ouvinte tem mais dificuldade nisso. Quem só vê televisão não precisa imaginar. A cena está ali, pensada por outro alguém. Quem não lê tem menos referências, menos vocabulário e, portanto, vai fazer menos imagens mentais. Ziraldo certa vez em uma entrevista disse que tudo que é importante no mundo está escrito. Por isso é imprescindÃvel ler, estudar.
Desta forma, quando vejo numa manifestação alguém com um cartaz pedindo a intervenção militar me vem à mente um monte de cenas que já estudei: um preso sem acusação formal, levado para um porão e torturado; um jornalista que não pode contar uma história; um grupo de estudantes que não podem se reunir; um sindicato fechado; livros sendo queimados. E imagino gente com medo de gente.
Não sei o que imagina quem levanta um cartaz desses. Duas possibilidades. Sabe o que pede e acha que vai estar do lado “certo” se acontecer. Ou, então, o pior, não tem a menor idéia do que pede e só repete feito um papagaio. Mas o certo é que não leu e nem estudou. E, se o fez, não entendeu nada.
(*) José Roberto Peters – Mestre em Educação CientÃfica e Tecnológica, professor universitário e consultor técnico da OPAS no Ministério da Saúde.
Sempre que a gente ouve ou lê uma história imagina suas cenas. Nosso cérebro cria imagens a partir das referências que tem. Quem lê ou é bom ouvinte sabe disso. Na leitura a descrição de um personagem ou de uma paisagem vai ganhando contornos quase que reais em nossa mente.
Eu, por exemplo, sempre que ouço Feijoada Completa, imagino o Chico Buarque dando a notÃcia pra Marieta Severo: “mulher, você vai gostar, tô levando uns amigos pra conversar...” imagino a Marieta com as mãos na cintura — feito um açucareiro — falando: “mas, Chico...”.
Guimarães Rosa no Grande Sertão escreve “passarinho que se debruça – o vôo já está pronto” e me vem à imagem o pequeno pássaro em cima do galho num movimento que parece que está a fazer flexões e, de repente, se lança no ar. Assim como a gente quando se prepara e se prepara e se arrisca a fazer algo que nunca havia feito.
Já percorri as ruas de Macondo com Garcia Marquez. Andei por um mosteiro da Idade Média com Eco e por toda Londres com Sherlock Holmes e seu amigo Watson. Isso sem nunca ter saÃdo daqui. Acompanhei a prova do teorema de Fermat com Simon Sing. Maravilhei-me com Einstein e o efeito fotoelétrico. Tudo isso nas páginas escritas.
Quem não lê ou não é um bom ouvinte tem mais dificuldade nisso. Quem só vê televisão não precisa imaginar. A cena está ali, pensada por outro alguém. Quem não lê tem menos referências, menos vocabulário e, portanto, vai fazer menos imagens mentais. Ziraldo certa vez em uma entrevista disse que tudo que é importante no mundo está escrito. Por isso é imprescindÃvel ler, estudar.
Desta forma, quando vejo numa manifestação alguém com um cartaz pedindo a intervenção militar me vem à mente um monte de cenas que já estudei: um preso sem acusação formal, levado para um porão e torturado; um jornalista que não pode contar uma história; um grupo de estudantes que não podem se reunir; um sindicato fechado; livros sendo queimados. E imagino gente com medo de gente.
Não sei o que imagina quem levanta um cartaz desses. Duas possibilidades. Sabe o que pede e acha que vai estar do lado “certo” se acontecer. Ou, então, o pior, não tem a menor idéia do que pede e só repete feito um papagaio. Mas o certo é que não leu e nem estudou. E, se o fez, não entendeu nada.
(*) José Roberto Peters – Mestre em Educação CientÃfica e Tecnológica, professor universitário e consultor técnico da OPAS no Ministério da Saúde.
Adorei o texto Beto! Como sempre, muito bem escrito. bjs
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