Lugares imaginados
Neiton de Paiva Neves
“Segunda Vida” (Second Life) é um já antigo jogo disponível na internet no qual a pessoa cria um lugar virtual, onde seu duplo vive e convive. Lá se pode ter família, casa, carro, barco, avião e todos os produtos das lojas, supermercados etc., tudo, enfim, e levar vida de luxo e fartura.
No filme de James Cameron, ex-marido de Kathryn Bigelow, “Avatar”, de meio bilhão de dólares e uma tunda de “Guerra ao Terror” no Oscar, que ela dirigiu gastando pouco, um humano é transformado em outro ser e enviado a outro mundo, “Pandora”.
No filme menos conhecido, “Os Substitutos” (Surrogates), com o duro de matar Bruce Willis, os humanos vivem tranquilos e seguros em suas casas, sem se desgastarem no trabalho, no dia a dia, com nada, enquanto seus robôs, réplicas perfeitas, os substituem em todas as atividades.
E quem não conhece os lugares imaginados dentre outros por escritores como Thomas More, em “Utopia”,de leitura obrigatória para os estudiosos de Direito; por Jorge Luiz Borges, em “O Aleph”, “o lugar onde estão, sem se confundirem, todos os lugares do orbe, vistos de todos os ângulos”; por Gabriel García Márquez, em “Cem Anos de Solidão”, em “Macondo”, uma cidade de construções com paredes de espelhos; por Lewis Carroll, no também clássico infanto-juvenil, “Alice no País das Maravilhas”, com nova versão para o cinema a ser lançada este mês; por James Hilton, em “Horizonte Perdido”, em “Shangri-lá”, “onde existe a eterna juventude e a felicidade plena”.
Não se esgotam nesses os exemplos do desejo presente no ser humano de estar em lugar diferente daquele em que vive, na esperança de viver melhor lá do que vive onde está. (São tantos que Alberto Manguel e Gianni Guadalupi fizerem o “Dicionário de Lugares Imaginários”, editado no Brasil pela Companhia da Letras).
Igualmente, na vida real, são inúmeros os casos de pessoas insatisfeitas com a própria vida e com o que lhes acontece, ou não acontece, e culpam, criticam e desprezam o lugar onde vivem, achando que quando se mudarem para esse ou aquele outro lugar seus problemas acabarão, como se o fim deles dependesse da geografia.
Sonhar é normal e faz bem à saúde, sabe-se. Mas, os sonhos, no sono ou no devaneio, não se bastam a si mesmos e nem constroem a realidade, apenas sendo úteis enquanto inspiram projetos de vida viáveis e motivam à ação para concretizá-los.
A licença poética, a diversão, a fuga temporária das agruras, o prazer sensorial, intelectual e até filosófico propocionados pela ficçao e pelos locais imaginários podem suavisar a vida.
Porém, como sugerem que a vida lá é mais fácil, podem também provocar reações negativas que muitos sequer percebem.
Fazem vítimas, as pessoas transmudadas em tristes figuras entorpecidas e adormecidas na ilusão, sempre à espera de um milagre que abra seus caminhos para e no embalado mundo da sua fantasia, e deixam de buscar e, muitas vezes, deixam passar à sua frente, sem vê-las, as oportunidas que as ajudariam a ser mais felizes onde estão e agora, alienando-se num futuro improvável ou impossível.
De minha parte, desde jovem estudante gosto muito do lugar imaginado pelo grande Manuel Bandeira, muito conhecido (para onde, sei, nunca irei), do qual não resisto a transcrever dois versos:
“Segunda Vida” (Second Life) é um já antigo jogo disponível na internet no qual a pessoa cria um lugar virtual, onde seu duplo vive e convive. Lá se pode ter família, casa, carro, barco, avião e todos os produtos das lojas, supermercados etc., tudo, enfim, e levar vida de luxo e fartura.
No filme de James Cameron, ex-marido de Kathryn Bigelow, “Avatar”, de meio bilhão de dólares e uma tunda de “Guerra ao Terror” no Oscar, que ela dirigiu gastando pouco, um humano é transformado em outro ser e enviado a outro mundo, “Pandora”.
No filme menos conhecido, “Os Substitutos” (Surrogates), com o duro de matar Bruce Willis, os humanos vivem tranquilos e seguros em suas casas, sem se desgastarem no trabalho, no dia a dia, com nada, enquanto seus robôs, réplicas perfeitas, os substituem em todas as atividades.
E quem não conhece os lugares imaginados dentre outros por escritores como Thomas More, em “Utopia”,de leitura obrigatória para os estudiosos de Direito; por Jorge Luiz Borges, em “O Aleph”, “o lugar onde estão, sem se confundirem, todos os lugares do orbe, vistos de todos os ângulos”; por Gabriel García Márquez, em “Cem Anos de Solidão”, em “Macondo”, uma cidade de construções com paredes de espelhos; por Lewis Carroll, no também clássico infanto-juvenil, “Alice no País das Maravilhas”, com nova versão para o cinema a ser lançada este mês; por James Hilton, em “Horizonte Perdido”, em “Shangri-lá”, “onde existe a eterna juventude e a felicidade plena”.
Não se esgotam nesses os exemplos do desejo presente no ser humano de estar em lugar diferente daquele em que vive, na esperança de viver melhor lá do que vive onde está. (São tantos que Alberto Manguel e Gianni Guadalupi fizerem o “Dicionário de Lugares Imaginários”, editado no Brasil pela Companhia da Letras).
Igualmente, na vida real, são inúmeros os casos de pessoas insatisfeitas com a própria vida e com o que lhes acontece, ou não acontece, e culpam, criticam e desprezam o lugar onde vivem, achando que quando se mudarem para esse ou aquele outro lugar seus problemas acabarão, como se o fim deles dependesse da geografia.
Sonhar é normal e faz bem à saúde, sabe-se. Mas, os sonhos, no sono ou no devaneio, não se bastam a si mesmos e nem constroem a realidade, apenas sendo úteis enquanto inspiram projetos de vida viáveis e motivam à ação para concretizá-los.
A licença poética, a diversão, a fuga temporária das agruras, o prazer sensorial, intelectual e até filosófico propocionados pela ficçao e pelos locais imaginários podem suavisar a vida.
Porém, como sugerem que a vida lá é mais fácil, podem também provocar reações negativas que muitos sequer percebem.
Fazem vítimas, as pessoas transmudadas em tristes figuras entorpecidas e adormecidas na ilusão, sempre à espera de um milagre que abra seus caminhos para e no embalado mundo da sua fantasia, e deixam de buscar e, muitas vezes, deixam passar à sua frente, sem vê-las, as oportunidas que as ajudariam a ser mais felizes onde estão e agora, alienando-se num futuro improvável ou impossível.
De minha parte, desde jovem estudante gosto muito do lugar imaginado pelo grande Manuel Bandeira, muito conhecido (para onde, sei, nunca irei), do qual não resisto a transcrever dois versos:
“Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada”.
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada”.
Neiton, você é fantástico na cinemania. Eu adorava cinema, mas hoje as telas são menores e o som não é tão poderoso. Cinema é um sonho sem fim. Eu, durante um ano, frequentei o Cine Rex todos os dias. Seja em vesperal ou proibido para menores. O meu patrão era locutor da Rádio Araguari-PRJ3 e os ingressos dos ouvintes acabavam na minha mão. Enjoei certamente porque os sonhos ficaram menores ou a gratuidade se foi. Também não gosto de pizza porque jantei-as todos os dias durante três anos no Bar do Bolinha. Então, se me chamarem pra pegar um cineminha seguido de pizza prefiro viajar nos textos internéticos.
ResponderExcluirDesculpe, mas houve um erro de grafia no nome do Manuel Bandeira. Ele ficava bravo se chamado de Manoel e eu confesso não saber o porquê.
Vejam como todas as filosofias, ideologias e religiões possuem o objetivo de tirar os abandonados seres humanos da realidade sofredora, induzindo-os à criação mental de outro mundo melhor. E naturalmente passam a criar filmes, novelas e outros apelos de vários matizes, especiais no caso do “Senhores dos Anéis”, “Avatar” e outros. O caso citado de "Shangri-la" (o prefeito escreveu Sangri-la) é das mais antigas formas de tirar as pessoas da realidade. A comunidade de Shangri-la é inspirada em Shambhala, o reino mítico de papel cosmogônico e escatológico, citado em textos védicos muito antigos, como os Purana, e referido na tradição oral e literária do Budismo tibetano como um centro irradiador de bem-aventurança e a residência de sábios iluminados.
ResponderExcluir"Shangri-la, da criação literária de 1925 do inglês James Hilton, Lost Horizon (Horizonte Perdido), é descrito como um lugar paradisíaco situado nas montanhas do Himalaia, sede de panoramas maravilhosos e onde o tempo parece deter-se em ambiente de felicidade e saúde, com a convivência harmoniosa entre pessoas das mais diversas procedências. Shangri-la será sentido pelos visitantes ou como a promessa de um mundo novo possível, no qual alguns escolhem morar, ou como um lugar assustador e opressivo, do qual outros resolvem fugir. O romance inspira duas versões cinematográficas nas décadas seguintes. No mundo ocidental, Shangri-la é entendido como um paraíso terrestre oculto."
Neiton, amigo querido
ResponderExcluircoisa boa a lembrança dos versos de Manuel Bandeira,nos fazendo sorrir, pensar em mudanças e, sem medo, ir embora prá Passargada. Parabéns pelo seu texto.Você sempre ensina...
De Neiton de Paiva Neves, por e-mail, ao blogueiro:
ResponderExcluir"Os comentários do Aristeu e do Natal muito me distinguem. E corrigem meus erros. Já que na revista não tem mais como, favor corrigir no blog: É *SHANGRI-LÁ* (cuja "existência" soube ao ler o livro de James Hilton, Horizonte Perdido, na saudosa juventude) , não SANGRI-LÁ , e é *MANUEL* Bandeira e não MANOEL. Embora ignorante em quase tudo, os erros foram falta de atenção minha, que só agora percebi.
Abraço."
Acho que o próprio Manuel Bandeira induziu muita gente a grafar o nome dele errado, embora ainda hoje muita gente inadvertidamente escreva Manoel Bandeira. A primeira vez que ele escreveu errado o próprio nome está registrado nos livros da Biblioteca Nacional no Rio, quando no antigo jornal “O Imparcial”, publicado em 25.12.1912, ao comentar sobre os escritores brasileiros imitadores da literatura francesa, ficou grafado errado o seu nome como Manoel Bandeira e não se sabe bem se foi intencionalmente. Mais tarde em 1960, consta que ele fez poesia para Maysa Matarazzo, publicada num jornal carioca, trocando uma letra do nome dela, denominando a homenageada de Maisa. Mas curiosamente assinou ao final como Manoel Bandeira, ou seja, propositalmente trocou uma letra do nome dela e fez o mesmo trocando uma letra do próprio nome. Curiosamente se vê que o nosso amigo cronista não precisa se desculpar tanto pela falibilidade comum a todos nós, mas uma coisa é certa: nunca mais vou esquecer que Manuel é o certo e nem a vinculação de Shangri-La com a vontade de libertar-se da realidade e voltar para passárgada. Enfim, estamos no lucro e somos melhores com os acertos e erros.
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